terça-feira, 21 de outubro de 2008

Ex-BOPE: mídia foi "criminosa e irresponsável" no caso Eloá

Equipe médica chega ao Centro Hospitalar de Santo André para a retirada dos órgãos da menina Eloá, 15 anos, na madrugada desta segunda-feira
Foto: Adriano Lima/Futura Press


Diego Salmen

A cobertura feita pela Rede Record, RedeTV! e Rede Globo prejudicou as negociações com Lindemberg Alves, na avaliação do ex-comandante do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) e sociólogo Rodrigo Pimentel. Para ele, a postura das emissoras foi "irreponsável e criminosa".

- O que eles fizeram foi de uma irresponsabilidade tão grande que eles poderiam, através dessa conduta, deixar o tomador das reféns mais nervoso, como deixaram, poderiam atrapalhar a negociação, como atrapalharam.


Lindemberg Alves, 22, manteve a ex-namorada Eloá e a amiga Nayara, ambas de 15 anos, como reféns por cinco dias em um apartamento na cidade de Santo André, em São Paulo. Na última sexta-feira, 17, o Gate (Grupo de Operações Taticas Especiais) invadiu o local. O incidente culminou na morte de Eloá.

Co-autor do livro "Elite da Tropa" e roteirista do filme "Tropa de Elite", Pimentel faz uma crítica ainda mais incisiva à inteferência da apresentadora Sonia Abrão, da RedeTV!, nas negociações. Ela entrevistou Lindemberg ao vivo na última quarta-feira, 15.

- Foi irresponsável, infantil e criminoso o que a Sonia Abrão fez. Essas emissoras, esses jornalistas criminosos e irresponsáveis, devem optar na próxima ocorrência entre ajudar a polícia ou aumentar a sua audiência.

Leia a seguir a entrevista com Rodrigo Pimentel:

Terra Magazine - Qual a responsabilidade objetiva dos governantes em incidentes como esse?
Rodrigo Pimentel -
O chefe da polícia estadual é o governador do estado. Quem define as políticas de segurança pública e suas prioridades é o governador, através do secretário de segurança pública. É lógico que ele não pode ser responsabilizado de forma isolada pelo que aconteceu. Não é a primeira vez que uma ocorrência com reféns termina em tragédia no país. Nem será a última. Se você fizer uma análise histórica dos casos com reféns aqui, o normal é que eles tenham sido conduzidos com pouca qualidade técnica, muito amadorismo. Há precedentes emblemáticos, como o caso do arcebispo mantido refém num presídio em Fortaleza, quando o governador Ciro Gomes determinou que se dessem armas e coletes aos seqüestradores, tudo foi feito ao contrário do que determinam as normas.

Que normas são essas?
Veja bem: são normas rígidas? Não. São protocolos internacionais que podem ser adaptados de acordo com a necessidade, mas que se baseiam em dados históricos coletados ao longo dos anos. (...) Nós sabemos, por exemplo, que a presença de familiares em 80% dos casos deixa o seqüestrador mais nervoso e arredio, menos propenso à negociação. O jornalista, por exemplo, é bom ou ruim? Eu diria que na maioria das vezes é ruim. Porém, em algumas ocasiões, não muito raras, a presença do jornalista ajuda o tomador do refém a se entregar. Ele percebe que o jornalista no local garante a preservação da sua vida. Então tudo exige um conjunto de avaliações momentâneas.

Como o senhor escreveu em artigo na Folha de S.Paulo, a responsabilidade está na medida em que há falta de investimentos, como por exemplo a falta de câmeras...
Nenhuma unidade tática no Brasil dispõe desse equipamento. São equipamentos baratíssimos, custam menos que uma viatura policial. E são muito necessários. Se o Gate (Grupo de Operações Táticas Especiais) tivesse esse equipamento, não teria feito a opção pela invasão. Porque ia perceber que a porta tinha obstáculos. E aqueles 14 segundos que a equipe policial perdeu na porta foi o tempo para acontecer a tragédia, foi o tempo que o Lindemberg precisou para alvejar as meninas.

Foi o erro crucial?
É, exatamente. Mas o erro mais fácil de ser sinalizado foi a reintrodução da menina Nayara. Você não tem precedente disso na história moderna da negociação. Tem um caso em que o refém voltou ao cativeiro em Nova Iorque, no ano de 1972, que até gerou o filme Um dia de cão, com o Al Pacino. Mas veja bem: foi há quase 40 anos, não havia uma técnica desenvolvida (para lidar com esse tipo de situação). E esse fato foi transformador da doutrina da polícia de Nova Iorque. O filme é maravilhoso: retrata marginais mentalmente perturbados e economicamente motivados; eles queriam assaltar um banco. Foi uma ocorrência dramática em que aconteceu algo igual ao que resultou na morte da Eloá. Jornalistas ligavam para os seqüestradores o tempo todo...

Como o senhor avalia a cobertura da mídia?
A Sonia Abrão, da RedeTV!, a Record e a Globo foram irresponsáveis e criminosas. O que eles fizeram foi de uma irresponsabilidade tão grande que eles poderiam, através dessa conduta, deixar o tomador das reféns mais nervoso, como deixaram; poderiam atrapalhar a negociação, como atrapalharam... O telefone do Lindemberg estava sempre ocupado, e o capitão Adriano Giovaninni (NR: negociador da Polícia Militar) não conseguia falar com ele porque a Sonia Abrão queria entrevistá-lo. Então essas emissoras, esses jornalistas criminosos e irresponsáveis, devem optar na próxima ocorrência entre ajudar a polícia ou aumentar a sua audiência.
O Ministério Público de São Paulo deveria, inclusive, chamar à responsabilidade, essas emissoras de TV. A Record se orgulha de ter ligado 5 vezes para o Lindemberg. Ele ficou visivelmente nervoso quando a Sonia Abrão ligou, e ela colocou isso no ar. Impressionante! O Lindemberg ficou: "quem são vocês, quem colocou isso no ar, como conseguiram meu telefone?". Olha que loucura! Isso jamais aconteceria nos Estados Unidos hoje, jamais. Aconteceu há quase 40 anos, mas jamais aconteceria nos dias de hoje. Foi irresponsável, infantil e criminoso o que a Sonia Abrão fez. Eu lamento não ter falado isso na frente dela. Eu gostaria de ter falado isso para ela e para os telespectadores da Record e da RedeTV!.
O que ela fez foi sem a menor avaliação. Tanto que, num primeiro momento, ele (o repórter Luiz Guerra) tentou enganar o Lindemberg, dizendo-se amigo da família. E depois ele tentou ser negociador, convencer ele a se entregar sem conhecer os argumentos técnicos usados para isso. O que o capitão Giovaninni falava para o Lindemberg a todo momento é que, até aquele momento, o crime que ele havia praticado era muito pequeno. Esse é o argumento técnico, funciona quase sempre. "Olha meu amigo, até agora você não matou ninguém, até agora só colocou essas pessoas sobre constrangimento, sua pena vai ser muito pequena...". Isso funciona mesmo. E a Sonia Abrão não tem esse argumento, a Record também não.

Podemos esperar mais casos com esse tipo de desfecho?
Outras virão, não vai ser a primeira nem a última vez. O que aconteceu ali, apesar de ser uma ocorrência com refém, é algo comum no Brasil. Ex-noivos, ex-maridos e ex-namorados matando suas ex-companheiras ou suas companheiras atuais. Nós temos Estados no Brasil, como Pernambuco, onde cerca de 20% dos homicídios são dessa natureza, praticados por companheiros. Uma mulher morre por dia em Pernambuco vítima do seu companheiro. Essa é outra questão para a gente refletir. Apesar de ser uma ocorrência com refém, o que chama a atenção é a morte de uma ex-namorada, o que é absurdamente comum no Brasil. Homens no Brasil matam suas companheiras com uma freqüência muito grande.

Fonte: Terra Magazine

3 Comentários:

Fabiano Roberto disse...

a televisão exagerou como sempre A televisão exagerou como sempre na cobertura.

Deveria ser proibido por lei mostrar imagens do local e tantas outras coisas, só faltou os repórteres invadirem o apartamento junto com a polícia e pedir para o seqüestrador aguardar eles (câmeras) acharem o melhor angulo para filmar ele dando os tiros nas garotas.

Sir Eddie Ferr disse...

Realmente, como disse o Pimentel a Mídia pode ajudar em alguns casos, ams nesse caso, só piorou. A imprensa nesse tipo de caso, muitas vezes antecipa o movimento da Polícia, e o sequestrador acompanhando pela Tv, fica um passo a frente da polícia.

A Record ,como sempre, é a que mais explora o caso, foi assim no caso Isabela, no caso João Aurélio, na guerra das polícias em SP, e muitos outros que estarão por vir.

Anônimo disse...

COMO AS CRENÇAS LESAM AS MENTES

4.1 Psicose Divina
Certa vez, eu vinha sendo perseguido por um “fantasma”. Ao perceber meu drama, um pastor propôs que me convertesse ao protestantismo; era a minha única saída, segundo ele.
Aí, pensei comigo: meu problema pode ser um ótimo passaporte para eu adentrar as entranhas dessas igrejas prodigiosas, e assim compreendê-las melhor. Acolhido como um novo irmão, vi o pastor escalar dois exércitos antagônicos, que vivem travando uma
armagedon espiritual. De um lado, uma legião de demônios cujo caudilho era Lúcifer. Do outro, uma ordem de anjos capitaneada por Jesus; a banda pela qual fui recrutado.
Depois de servir de bumerangue por algum tempo, pressenti que o meu fantasma que outrora era um, agora se havia multiplicado numa falange. Como entrei na seita, partindo do princípio de que eu tinha inimigos invencíveis, e que para continuar resistindo-os, eu teria que viver em combate permanente. O mundo tornou-se mais hostil e conflitivo para mim: eu trombava contra tudo e contra todos. Minhas doenças psicossomáticas e problemas existenciais de toda sorte vinham-se agravando, à medida que eu me afunilava naquele processo de paranóia; via a presença do diabo em tudo que viesse de encontro a minha doutrina. E o pastor me advertia: “Resisti o diabo e ele fugirá de vós; mas se desertardes do quartel de Cristo, o número de capetas que levareis convosco, será sete vezes maior!” Mas para que me mantivesse imune aos adversários, eu teria que comprar uma “vacina”, cuja dosagem era paga em dízimos e trabalhos semi-escravos, e o pior: seu efeito não durava 12 horas.
Então, foi que despertei, enfim; voltei à “vida mundana”, não fui obsediado por espírito algum. Conclusão: eu teria montado uma batalha cujo campo era a minha mente e o cavalo dela era eu mesmo.